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O Supremo Tribunal Federal concluiu, no último dia 17, o julgamento do RE 878313 fixando seu entendimento no sentido de que a contribuição social prevista no artigo 1° da LC 110/2001 (FGTS 10%) foi constitucional, tendo em vista a persistência do objeto para a qual foi instituída. Porém, a discussão judicial que envolve a validade desse tributo ainda não foi encerrada pela Suprema Corte que poderá, em breve e pela terceira vez, analisar a constitucionalidade dessa contribuição.
A constitucionalidade da contribuição social instituída pela LC 110/2001, cobrada até o final de 2019 na demissão injustificada de trabalhadores, nunca foi unanimidade no meio jurídico. Antes mesmo do seu primeiro aniversário, a Confederação Nacional da Indústria ajuizou a ADI n° 2556 questionando a validade constitucional dessa contribuição, sob a perspectiva de que instituição desse tributo violaria diversos dispositivos constitucionais, em especial o artigo 5º, LIV, diante da falta de correlação entre a necessidade pública e a fonte de custeio.
No julgamento dessa ação, ocorrido no já longínquo ano de 2012, o Supremo Tribunal Federal, sob a relatoria do então Ministro Joaquim Barbosa (o qual viria a se tornar presidente da Casa pouco tempo depois), definiu que o tributo em questão seria constitucional, tratando-se de uma contribuição social, já que havia sérias dúvidas quanto à sua natureza jurídica, dadas as suas peculiaridades ‘sui generes’, em especial seu fato gerador e sua destinação.
Nessa época, os contribuintes tinham iniciado na justiça uma nova discussão envolvendo esse mesmo tributo. Essa nova discussão referia-se ao possível esgotamento da finalidade que motivara a criação dessa nova contribuição em 2001. De acordo com essa tese, os recursos então arrecadados com esse tributo estariam sendo direcionados para outras finalidades, já que o rombo causado nas contas do FGTS já teria sido coberto em 2007.
Na ocasião do julgamento do ADI 2556, o Ministro Relator ventilou em seu voto que “o argumento relativo à perda superveniente de objeto dos tributos em razão do cumprimento de sua finalidade deverá ser examinado a tempo e modo próprios”. Ocorre que essa tese da inconstitucionalidade superveniente pelo esgotamento da finalidade não foi apresentada nos fundamentos da ADI em questão, motivo pelo qual não poderia ser apreciada no momento do seu julgamento. Sejamos justos, a ADI foi proposta pouco tempo após a instituição do tributo, momento em que a sua finalidade, obviamente, ainda não havia sido exaurida.
Então, em setembro de 2015 a maioria dos Ministros do Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão geral do tema tratado no RE 878313/SC, no qual uma empresa do Estado de Santa Catarina questiona a validade constitucional da contribuição “FGTS 10%” sob a perspectiva do esgotamento da sua finalidade e, por essa razão, da sua inconstitucionalidade superveniente.
O recurso tramitou no STF até o último dia 17, quando, por maioria, a Suprema Corte declarou, mais uma vez, a constitucionalidade da exação prevista no artigo 1° da LC 110/2001, sob o fundamento de que não ocorreu o esgotamento da finalidade pretendida pelo legislador na sua criação.
O julgamento terminou com 6 votos pela constitucionalidade do tributo e 4 pela inconstitucionalidade da exação. O voto do relator, Ministro Marco Aurélio, foi no sentido de que o tributo se tornou inconstitucional em 2012, com a cobertura do déficit nas contas do FGTS. Acompanharam seu voto os Ministros Edson Fachin, Rosa Weber e Roberto Barroso.
Já para o Ministro Alexandre de Moraes, responsável pelo voto vencedor, a finalidade prevista com a instituição da contribuição seria mais ampla que aquela expressada no artigo 4° da LC 110/2001, e não teria sido atingida, de modo que a contribuição permaneceu constitucional até a sua extinção, no final de 2019. Seu voto foi acompanhado pelos Ministros Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Gilmar Mendes.
Apesar desse cenário desfavorável para os contribuintes, tudo indica que a discussão que gira em torno desse mal afamado tributo ainda não terminou.
A Emenda Constitucional n° 33/2001 alterou o texto da Constituição Federal, incluindo o § 2º, III, “a”, no artigo 149, determinando que as contribuições sociais (caso do tributo em questão) e as contribuições de intervenção no domínio econômico (CIDE) passassem a incidir apenas sobre o faturamento, a receita bruta, o valor da operação ou o valor aduaneiro (no caso de importação).
Assim, de acordo com a tese tributária tratada no STF, a Emenda Constitucional n° 33/2001 teria extinguido a contribuição social prevista no artigo 1° da Lei Complementar n° 110/2001, uma vez que a sua base de cálculo estava relacionada ao montante depositado na conta vinculada ao FGTS do trabalhador dispensado, não guardando qualquer relação com as hipóteses previstas no texto constitucional (inconstitucionalidade material superveniente).
O Ministério Público, interessante citar, já se manifestou reconhecendo a inconstitucionalidade de tributos que incidem sobre hipóteses não contempladas pelo artigo 149, § 2º, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal. De acordo com o MP, “não há mais como prevalecer o entendimento de que lei ordinária, ou até mesmo complementar, possa prever outra modalidade de base de cálculo para a exação, em se tratando de alíquota ‘ad valorem’, que não o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação, e, no caso de importação, o valor aduaneiro. É que, após a EC 33/2001, a base de cálculo da exação alcançou nível constitucional, não podendo, por isso, ser acrescentada outra base de cálculo ao elenco previsto constitucionalmente”.
Assim, tudo indica que o Supremo Tribunal Federal, pela terceira vez, será obrigado a analisar a constitucionalidade do tributo instituído pelo artigo 1° da LC 110/2001.
A discussão acabou, mas está longe de terminar.
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